(Artigo de Opinião) Yoga Hindu ou Jaina? Aṣṭāṅga ou Haṭha? Quantos Yogas existem?

A Cultura é determinante na definição da Ciência Contemplativa porque a enforma. Daí que no caso do Yoga possamos ter várias manifestações inter e intra-culturais. O exemplo paradigmático é o da distinção entre os Yoga-s Hindu, Budista e Jaina. O primeiro enformado pelo Hinduísmo Ortodoxo, segundo e terceiro enformados pelas Heterodoxias que constituem Budismo e Jainismo. Claro que há diferenças entre estas três formas de Yoga e que podem ser profundamente vincadas. Os sistemas de cakra-s do Yoga Hindu são bem diferentes dos que temos no Budismo Tibetano. Porém, “ao final do dia”, como se costuma dizer, tudo é redutível ao mesmo: sair da esfera do ego para se ter uma visão existencial holística. Isso fica patente se mergulharmos internamente num desses tipos. Por exemplo, no Yoga Hindu temos uma heterogeneidade de pressupostos e instrumentos difícil de abarcar. Vejamos as acentuadas diferenças entre o que encontramos na Bhagavadgītā, no Yogasūtra-s de Patañjali, no leque de Tantra-s e Tratados de Haṭha. No caso concreto do Haṭha, relembremos que se origina da miscenização de ideias e culturas: o que restou de Śaiva e Tantra; Alquimia Indiana e Árabe; Cultos Aborígenes da India e países vizinhos; Islamismo e Sufismo; entre outras influências comprovadas. Actualmente, no mundo globalizado, temos uma panóplia de yoga-s: Postural, Aṣṭāṅga Vinyāsa, Vinyāsa Flow, Kuṇḍalinī, Iyengar, mais os sincretismos que despontam à velocidade do bolor, como aereal, sup, yin, e tantos outros!

Portanto, é frequente falar-se de vários tipos e estilos de Yoga, pertencentes à escola sicrana, ou filosofia beltrana. Estas separações valem o que valem, diríamos. Talvez sejam úteis apenas para traçar algumas “distinções” que se revelam ilusórias, com o passar do tempo e aprofundar da prática. Talvez se justifiquem na medida em que possibilitam à pessoa escolher os instrumentos teóricos e práticos que melhor lhe poderão servir no caminho soteriológico, tendo em conta o seu condicionamento pessoal-familiar e social-cultural. Porém, não possuirão sentido intrínseco na medida em que o seu destino, inevitavelmente, passa pelo descarte.

Sendo o Yoga filtrado pela psicologia humana, o produto é uma consequência das linhas com que coze tal actividade psíquica. Tendemos a abalizar individualmente e colectivamente porque é assim que funciona a nossa mente ou aparelho psíquico, como lhe queiramos chamar. Fazemos isso em função do nosso legado individual e familiar, bem como, da sociedade e cultura em que estamos inseridos. Por esta razão, é comum ouvir místicos e directores espirituais aconselharam a pessoa a não escolher uma via contemplativa afastada daquela em que nasceu e foi criada. A quem cresceu num ambiente judaico-cristão, o ideal seria procurar as soteriologias propostas dentro desse espaço cultural, ao invés de se virar para outras que lhe são alienígenas. Alguns académicos, como o célebre caso de C. G. Jung, apontam a mesma questão. Normalmente o argumento tem a ver com parcimónia: a pessoa ao mudar para uma linguagem simbólica que não é a sua de origem, psicologicamente, pode trazer ainda mais confusão ao processo soteriológico, algo que não se quer. Em todo o caso, esta advertência será para ser vista como uma sugestão, não como uma imposição.

A escolha de um “tipo” de Yoga depende da predisposição individual da pessoa. Se é emocional, talvez lhe caiba melhor um estilo devocional. Se for racional, é possível que progrida com um estilo intelectual. Ou exactamente o contrário: o emocional que procure a via intelectual e vise versa. Não há fórmulas! Há escolhas que devem ser tomadas, avaliando-se os resultados para ver se valem a pena ser mantidas ou alteradas! A predisposição colectiva tem igualmente uma palavra a dizer, como já vimos. Aspecto que muitas vezes traz a guerra dos “ismos”: o meu “ismo” é melhor que o teu, porque sou do Hinduísmo e tu do Cristianismo, ou vice-versa! Que diferença haverá entre o Bhakti de Arjuna a Kṛṣṇa e a devoção ardorosa de Santa Teresa de Ávila e ao Senhor Jesus Cristo?

Relembremos que o Yoga será maiormente redutível à ideia de Ciência Contemplativa, à revelia da veste cultural que possa assumir. Veste essa que, repita-se, algures durante o caminho terá que ser despida, tal como o escorpião larga a casca. Devemos tomar o Yoga pela definição que incorpora: “união ilimitada”. O que deve ficar claro, consideramos, é que tudo é contemplação e meditação ou visa chegar ao silêncio, a mauna; acabar com a imposição do ego na percepção do mundo. Existirão tantos “yoga-s” quanto o ego queira. Já o Yoga será um, como o Ilimitado.

Mestre Pastinha da Bahia, um célebre professor de Capoeira, a arte marcial brasileira, dizia que “Capoeira é tudo o que boca come”. Apresentados os devidos créditos, vamos decalcar a frase para o Yoga, pois diríamos talqualmente que o Yoga é tudo o que boca come, enquanto se mantiver fiel a si. Um passeio à floresta, alguns quilómetros de natação, momentos de namoro, ler e escrever poesia, tudo é Yoga se a atitude subjacente for condizente.

Joel Machado

 

(Esboçando o Oṃ Hindu, Budista e Jaina | Foto/Créditos: Joel Machado)

 

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