Yoga Upaniṣad-s

Conhecem-se mais de 200 Upaniṣad-s, oral e textualmente redigidas ao longo de milénios, a maioria delas traduzidas, pelo menos para o inglês. De entre este leque, a generalidade dos Tradicionalistas Hindus defende um Cânone de 108, denominado Muktikā (“libertação”). Estas, grosso modo, são divididas de acordo com datação e temática dominante. Temos então as mais antigas, Mukhya ou “Principais”, e Sāmānya, Sannyāsa, Śākta, Vaiṣṇava, Śaiva e Yoga, também designadas como “Menores” ou Upa.

Neste Cânone as Yoga Upaniṣad-s constituem um conjunto de textos relativamente mais recentes, onde se incluem: Nādabindu, Yogachūḍāmaṇi, Darśana, Amṛtabindu, Tejobindu, Amṛtanāda, Kṣurika, Dhyānabindu, Brahmavidyā, Yogatattva, Yogaśikhā, Yogakuṇḍalini, Varāha, Advayatāraka, Haṃsa, Triśikhi, Maṇḍalabrāhmaṇa, Śāṇḍilya, Pāśupata e Mahāvākya Upaniṣad.

Estas Upaniṣad-s, como a tipologia o indica, versam o Yoga, nas suas componentes Teórica e Prática, em muitos aspectos mediante uma tonalidade que mistura elementos heterógenos de: de Yoga Clássico Patañjali; Yoga pós-Clássico; Tantra e Vaiṣṇava; Haṭha; e, obviamente, Vedānta. Na verdade, uma das questões que dificulta a datação deste corpo de Upaniṣad-s poderá ter a ver precisamente com a incorporação de ideias do Haṭha, que poderá ter ocorrido numa fase posterior à sua transmissão e redacção iniciais. Como sempre, pouca certeza há a este respeito.

Da Ontologia à Metodologia Soteriológica, as Yoga Upaniṣad-s versam crítica e expositivamente variados elementos e abordagens do Yoga, curiosamente, muitos deles ausentes tanto na Bhagavadgītā como no Yogasūtra-s de Patañjali. Alguns destes textos apresentam o Yoga como um conjunto de “etapas” ou “auxiliares” (āṅga-s) que visam atingir, ou reencontrar, o natural estado de Libertação, portanto, em geral, enquanto “meio” e o “fim”. Com maior ou menor minúcia tratam-se preliminares éticos e disciplinares à prática, como yama e nyama, posturas (āsana), exercícios de expansão da respiração (prāṇāyāma), a internalização dos sentidos (pratyāhāra), concentração (dhāraṇā) e meditação (dhyāna), a Absorção (ou Samādhi), e conceitos como nāda, kuṇḍalinī e fisiologia subtil, imbuídos de uma tonalidade mais Tântrica.

A tonalidade vedântica neste Yoga por āṅga-s talvez se revele com maior saliência nas seguintes Yoga Upaniṣad-s: Nādabindu, Amṛtabindu, Dhyānabindu, Tejobindu, Yogaśikhā, Yogatattva, e Haṃsa (1). Em todo o caso, principalmente entre os “adeptos” do Vedānta, também se considera que é errado dizer que existam Upaniṣad-s “mais” vedânticas que outras, chegando-se a afirmar que a própria divisão em Yoga Upaniṣad-s não faz sentido na medida em que todas versam precisamente o Yoga, seja como for, que visam a discriminação e o reconhecimento da Natureza Una inerente ao indivíduo.

De facto, como por exemplo observam Eliade (2) e Feuerstein (3), tomado no seu todo, este grupo de Upaniṣad-s, promove um tipo de Yoga assente nos pressupostos basilares da metafísica Vedānta: tvam asi (“Tu És Isso”), Ahaṁ Brahmāsmi (“Eu Sou o Absoluto”) e sarvam bramāsti (“Tudo isto é o Absoluto”); por conseguinte, procuram revelar ou relembrar que a Realidade é Una e que em verdade estamos apenas com o Ser, ditoso e superconsciente. A esse Ser, estas Upaniṣad-s continuam a dar vários nomes, sendo as designações mais comuns o “Absoluto” (Brahman) e o Self/Si (Ātman). Assim, estes textos conservam no seu cerne a ideologia ancestral das Upaniṣad-s mais antigas, apesar de serem muito provavelmente oriundas de uma era pós-Patãnjali, daí: a sistemática proposta de divisão do Yoga em āṅga-s; e o facto de conterem profundos elementos de Haṭha, patente na alusão à transcendência do corpo na vivência da sua própria fisicalidade durante a prática de Yoga e seus processos.

Estes últimos aspectos têm sido abordados por investigadores do Haṭha Yoga Project, da SOAS-University of London (4) com particular destaque para o trabalho de Christian Bouy, Les Nātha-yogin et les Upaniṣads: Étude d'histoire de la Littérature Hindoue. Em todo o caso, no geral, ainda é preciso fazer uma análise aprofundada deste corpus de Upaniṣad-s, ao nível da contextualização histórico-cultural e de novas traduções e comentários, na medida em que o existente, de algum modo, não será suficiente.

Para uma primeira análise individual de algumas destas Upaniṣad-s, aconselha-se o resumo e organização temática proposta por Feuerstein (5):
  • Upaniṣad-s versando Absoluto enquanto Som e/ou Vibração: Amṛtabindu, Amṛtanādabindu, Nādabindu, Dhyānabindu, e Tejobindu;
  • Upaniṣad-s versando Som, Respiração e Transcendência: Haṃsa, Yogaśikhā, Yogatattva, Brahmavidyā, Mahāvākya e Pāśupata;
  • Upaniṣad-s versando um Yoga Fótico: Advayatāraka e Maṇḍalabrāhmaṇa;
  • Upaniṣad-s versando um corte com os nós da Consciência “vulgar”: Kṣurika;
  • e Upaniṣad-s versando a transmutação corporal segundo uma tonalidade Haṭha: Yogakuṇḍalini, Yogatattva, Yogaśikhā, Varāha, Śāṇḍilya, Triśikhi, Darśana e Yogachūḍāmaṇi.


Joel Machado


Notas
(1) Tal como proposto por P. Deussen, Paul (2010).
(2) The Yoga tradition, 1998.
(3) Yoga. Immortality and Freedom, 1958.
(4) http://hyp.soas.ac.uk/
(5) The Yoga tradition, 1998.




Bibliografia

Bouy, Christian (1994) Les Nātha-Yogin Et Les Upaniṣads. Paris. Diffusion de Boccard.

Deussen, Paul (2010). The Philosophy of the Upanishads. Edinburgh. Cosimo, Inc.

Feuerstein (1998) The Yoga tradition. Phoenix, Arizona. Hohm Press

Eliade, Mircea (1958) Yoga. Immortality and Freedom. New York. Princeton.

Feuerstein, Georg (1998) The Yoga tradition. Phoenix, Arizona. Hohm Press.
 
 
( īśopaniṣad | Foto/Créditos: Domínio público

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