Amiudadamente surge a confusão sobre o que é o Yoga. De onde vem? Como evoluiu e para onde? Uma tentativa de definição comum é de procurar situar o Yoga enquanto “meio”, “fim” ou ambos desde a sua origem num contexto Histórico. Opção que nem sempre tem sido pacífica. Todas as áreas de estudo são propícias a este tipo de enviesamento, dir-se-ia, em todo o caso não espanta que onde haja mais subjectividade o problema acresça. Com efeito, até recentemente (séc. XIX e XX), penso não ser exagero dizer que a História do Yoga era predominantemente enquadrada numa abordagem Mistificada e Tradicional, profundamente condicionada por visões sectárias, associadas a movimentos religiosos ou à transmissão “idiossincrática” de gurus, tendo-se gerado, em casos extremos, situações em que cada boca fomentava a sua própria “estória” do Yoga.
Lembro-me do primeiro curso de Yoga que fiz onde me foi garantido, friso, que “o Yoga teria sido introduzindo no planeta Terra há aproximadamente 5 mil anos, por Śiva, que transmitira toda a Filosofia e Técnica inerentes ao Yoga durante essa aparição, por exemplo, desenvolvendo o corpus de 84 āsana-s pela observação de animais na floresta; mais tarde (já séc. XX), manifestara-se novamente sob a forma de um Guru que tornara a sistematizar os ensinamentos do Yoga para os adaptar à presente época”. Obviamente não se quer desdenhar este tipo de versões, fique claro, até porque são abundantes e frequentemente encerram um intenso fervor ao seu redor, ferindo-se susceptibilidades que merecem respeito. Pode-se no entanto exercer o direito de procurar outro caminho: concretamente, um enquadramento Antropológico, Histórico, Cultural e Filológico, do modo como surgiu, tem vindo a evoluir e reinventar-se esta Ciência Contemplativa, utilizando uma terminologia de Alan B. Wallace (1).
Esse é um processo que conhece um ponto de viragem com a entrada do Ocidente no Oriente, juntamente com os aspectos negativos e positivos que esse movimento teve. Das imposições colonialistas e interpretações etnocêntricas às tentativas de realmente embeber das duas Culturas, muito se disse e escreveu. Entre académicos e espiritualistas, por vezes ambos, nomes como Max Müller, Madame Blavastsky e Sociedade Teosófica, Sir John Woodroffe ou Arthur Avalon, Mircea Eliade, Georg Feuerstein, David Frawley, James Mallinson, ficando tantos mais de lado, veem deixando o seu contributo. Do outro “lado”, e a partir de certa altura, figuras proeminentes da Índia, como Ramkṛiṣṇa Pôromôhongśa, Vivekananda, S. Dasgupta, Paramahansa Yogananda, Jiddu Krisnamurti, Aurobindu, T. Kṛiṣṇamācārya, K. Pattabhi Jois, B.K.S Iyengar, legaram o seu contributo.
Lembro-me do primeiro curso de Yoga que fiz onde me foi garantido, friso, que “o Yoga teria sido introduzindo no planeta Terra há aproximadamente 5 mil anos, por Śiva, que transmitira toda a Filosofia e Técnica inerentes ao Yoga durante essa aparição, por exemplo, desenvolvendo o corpus de 84 āsana-s pela observação de animais na floresta; mais tarde (já séc. XX), manifestara-se novamente sob a forma de um Guru que tornara a sistematizar os ensinamentos do Yoga para os adaptar à presente época”. Obviamente não se quer desdenhar este tipo de versões, fique claro, até porque são abundantes e frequentemente encerram um intenso fervor ao seu redor, ferindo-se susceptibilidades que merecem respeito. Pode-se no entanto exercer o direito de procurar outro caminho: concretamente, um enquadramento Antropológico, Histórico, Cultural e Filológico, do modo como surgiu, tem vindo a evoluir e reinventar-se esta Ciência Contemplativa, utilizando uma terminologia de Alan B. Wallace (1).
Esse é um processo que conhece um ponto de viragem com a entrada do Ocidente no Oriente, juntamente com os aspectos negativos e positivos que esse movimento teve. Das imposições colonialistas e interpretações etnocêntricas às tentativas de realmente embeber das duas Culturas, muito se disse e escreveu. Entre académicos e espiritualistas, por vezes ambos, nomes como Max Müller, Madame Blavastsky e Sociedade Teosófica, Sir John Woodroffe ou Arthur Avalon, Mircea Eliade, Georg Feuerstein, David Frawley, James Mallinson, ficando tantos mais de lado, veem deixando o seu contributo. Do outro “lado”, e a partir de certa altura, figuras proeminentes da Índia, como Ramkṛiṣṇa Pôromôhongśa, Vivekananda, S. Dasgupta, Paramahansa Yogananda, Jiddu Krisnamurti, Aurobindu, T. Kṛiṣṇamācārya, K. Pattabhi Jois, B.K.S Iyengar, legaram o seu contributo.
Numa perspectiva académica, essencialmente, a génese e evolução do Yoga têm sido enquadradas no curso dos movimentos civilizacionais no Oriente, principalmente Cordilheira Himalaia, Península Indiana e Sudoeste Asiático. Daqui retira-se um pressuposto básico, o de operar todo esse enquadramento em função da origem e cristalização do Hinduísmo que, por sua vez, leva a distinguir o conceito de Yoga Hindu dos de Yoga Jaina e Yoga Budista (apesar de em última análise, todos visarem o mesmo “fim”, ainda que à custa de “meios” distintos e enroupados de roupagem cultural diferente).
Assim, falar de Yoga Hindu será falar de Hinduísmo, necessariamente, desde os seus antecedentes e primórdios à actualidade. Porém, também este caminho está longe de ser pacífico ou consensual, apesar de se aceitarem alguns elementos comuns. Que são? Primeiro, normalmente aceita-se um percurso em que o Yoga terá evoluído na seguinte linha: de um Proto-Yoga, a um Yoga Pré-Clássico, ao Yoga Clássico e, finalmente, ao Yoga Pós-Clássico e Moderno. Segundo, enquadra-se esse percurso numa série de Períodos Históricos que estão predominantemente ligadas às tradições e produções textuais que as marcam: Pré-Védico (6500-4500 a.C.), do qual se têm maioritariamente vestígios arqueológicos; Védico (4500-2500 a.C.) e Brahmânico (2500-1500 a.C.), dos quais se têm os Veda-s; Pós-Védico ou Upaniṣadico (1500-100 a.C.), com as primeiras Upaniṣad-s; Pré-Classico ou Épico (1000-100 a.C.), com os grandes Épicos, Mahābhārata, Bhagavadgītā e Rāmāyaṇa; Clássico (100 aC – 500 d.C.) e a formulação do Sāṃkhya-Yoga Darśana, com a consagração do Yogasūtra de Patañjali; Tântrico-Purânico (500-1300 d.C.) e Sectário (1300-1700 d.C.), incluindo Purāṇa-s, Tantra-s, Āgama-s e Saṃhitā-s (Śaiva-s, Śakta-s e Vaiṣṇava-s), literatura sistematizadora do Vedānta, aos textos de Haṭha; e Moderno (1700-actualidade), literatura académica Oriental e Ocidental.
Como se pode observar, isto ocorre ao longo de milénios, sendo a questão da precisão das datações (no caso anterior, emprestada de G. Feuerstein (2)) extremamente complicada por várias razões: essencialmente a falta de sítios e elementos arqueológicos, a dificuldade em datá-los e o facto de uma parte considerável (há quem diga a maior) do conhecimento inerente ao Yoga não ocorrer em registos textuais, dado que a sua transmissão ocorria oralmente, como já foi referido.
Isso leva à confusão em relação às linhas cronológicas, principalmente na delimitação dos períodos. A sugestão que deixo é a de não se procurar isolar em compartimentos estanques, na medida em que isso não parece exequível dado não ser baseado no real; o real é contínuo e não se passa de um movimento para outro como do negro para o branco; como diria uma amiga praticante de longos anos, “vejamos a comparação com a sucessão de Períodos e Movimentos Artísticos, na medida em que nunca acaba um para dar imediatamente lugar ao outro, como se mudassem as marés repentinamente, há sempre uma fase espectral fazendo a transição de uma tónica geral para a seguinte”.
Finalmente, também pode ser sensato não assumir à partida que o Yoga é estritamente um “produto” indiano, tendência que parece dominante e, de algum modo, acerrimamente defendida pela própria Índia, por ventura com uma motivação nacionalista, o que não é de levar a mal, mas pede que seja devidamente compreendida e enquadrada. Nesse sentido, refiro que também só recentemente se olhou para a génese Xamânica do Yoga com olhos de ver. Analogamente, o facto do Yoga Hindu também dever na sua origem, e muito, ao precursor Yoga Budista, que terá sido expulso da Índia, por razões que são relativamente conhecidas. Ademais, a mesma questão poderá ser elucidada pelo estudo dos Misticismos da Antiguidade Egípcia e Grega, Místicas Cristã e Islâmica, e o modo como se movimentaram geográfica e sociologicamente, ao longo dos Períodos supra-mencionados.
Joel Machado
Notas
(1) Contemplative Science, 2007.
(2) The Yoga tradition, 1998.
Bibliografia
Wallace, B. Alan (2007) Contemplative Science. New York. Columbia University Press.
Feuerstein (1998) The Yoga tradition. Phoenix, Arizona. Hohm Press.
(Relevo represnetando um yogin em Hampi, Karnataka | Foto/Créditos: Hatha Yoga Project)
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